17 de agosto de 2009

Fiar

Vai abá caminhando pela mata,
ouve uma saudação,
juriti voz poderosa, rouca, cavernosa,
lenta é sua ode, mas contagia a povoação.

O baixão, a serra, o morro, o sertão,
conhece a voz da juriti, que canta
e todos a conhece, basta ser dali.
Dali da terra, bem pertinho de te.

E o homem que caminha é dali.
Seu olho penetra a mata,
Como flecha certeira que corta
A verticalidade da física em movimento retilíneo.
Acertando a presa, rápida.
Que cai. Num instante repentino.

O homem se aproxega da pindoubeira
Que ergue majestosa sua copeira,
Dando abrigo ao sanhaço,
Bacurau e a lavadeira.

Ergue seu membro superior,
E puxa como a garra felina a caça,
Tira o homem uma palha,
Um galho, outro galho e outro.
Vários galhos e leva parra casa.

No oitão da casa,
Os filhos o arrodeiam,
Vê-o tirar fibra por fibra,
E da cabeça do pai não consegue imaginar.
O abá quer monhagá.

O que o chefe quer,
Com tanta palha?
O que fará?
Olhando sempre,
Sem um olho piscar.
Kunumï ver o mestre fazer,
Para depois imitar.

Uma mão vai por cima,
A oura levemente cruza a diagonal
Da imagem espalmada na terra
E chega a um ponto final.

E cruza daqui
E cruza de lá.
Sem matutar
Constrói um belo,
E sempre único,
Grande e de utilidade,
Um Caçuá.

Terminada a obra,
Se alevanta e vai buscar.
Mandioca na roça,
Para esposa cozinhar.

As crianças ficam com a sobra,
Outros cestinhos vão criar.
Que imitaram o pai,
Esse que viva para enchegar.

E assim, se aprende,
Nas terras de Mirandelá.
Criança faz trabalho de criança,
Pra quando adulto saber se virar.

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